Por: Saiba
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O jornalista e poeta mossoroense Crispiniano Neto
dirige pela terceira vez a Fundação José Augusto, órgão com status de
secretaria de Cultura no Rio Grande do Norte, embora ainda vinculado à pasta de
Educação. Diferente das duas primeiras oportunidades, quando deixou a FJA sem
conseguir concluir o trabalho e com pendências financeiras em razão de falta de
recursos, a marca que ele pretende imprimir dessa vez é a da reconstrução da
política cultural do Estado.
Para tanto, terá que driblar uma barreira já
bastante íntima para quem produz e administra cultura no país: a falta de
dinheiro.
– Nas outras
duas ocasiões em que estive na Fundação José Augusto reuni o pessoal para
planejar as ações em três etapas: o que podemos fazer sem dinheiro; o que
podemos fazer com pouco dinheiro; e o que podemos fazer com um pouco mais de
dinheiro ou com muito dinheiro.
No primeiro decreto editado pela governadora
Fátima Bezerra, uma das primeiras vítimas foi a cultura de eventos. Estão proibidos
patrocínio e apoio à realização de festividades, eventos culturais,
solenidades, recepções, confraternizações, homenagens, enfeites, presentes e
outras situações similares.
O Orçamento previsto para a Cultura em 2019 é de
aproximadamente R$ 6 milhões. Orçamento, como se sabe, é apenas uma previsão.
Com o Governo Fátima juntando os centavos para pagar um passivo de R$ 1 bilhão
só com servidores, Crispiniano Neto ainda não sabe quanto terá à disposição.
Questionado sobre onde serão investidos os possíveis recursos, o gestor não
quis se antecipar:
– Vamos
abrir o diálogo com os segmentos, tomar pé da situação primeiro.
Uma ideia já definida é abrir editais de ocupação
sem custo para o Estado tanto para a Biblioteca Câmara Cascudo como para o
teatro de Mossoró Lauro Monte Filho:
– Vamos
convocar os artistas para elaborar uma programação de ocupação. Não teremos
dinheiro para pagar por esses editais, mas depois podemos contratar esses
artistas e produtores que se dispuserem a participar. E assim esperamos
oferecer na Biblioteca Câmara Cascudo oficinas de poesia, sobre cinema, curso
sobre literatura, história do Rio Grande do Norte. No teatro de Mossoró vamos
abrir edital para os grupos.
Antes de lançar esses editais de ocupação, no
entanto, o diretor da Fundação José Augusto terá que resolver outro problema.
Tanto a biblioteca Câmara Cascudo como o teatro de Mossoró foram inaugurados
sem condições de funcionamento. Fechada há mais de 10 anos, na gestão do
próprio Crispiniano, ainda no governo Wilma de Faria, a biblioteca ainda não
foi aberta ao público:
– A
Biblioteca fechou na minha época e deixei o projeto pronto. Fizeram outro
(projeto) e o MinC brecou. Foi inaugurada a obra agora em dezembro, mas sem
condição nenhuma de funcionamento. Faz 25 anos que não se compra um livro para
a Biblioteca Câmara Cascudo. São inúmeras questões para poder funcionar. A
mesma coisa é o teatro de Mossoró Lauro Monte. Abriram, mas não tem condição
nenhuma de funcionamento
Ele adianta que pretende retomar projetos que
deixou prontos em sua última passagem, mas foram engavetados pela sucessora
Isaura Rosado. Segundo ele, haviam 45 projetos elaborados que, somados,
custariam cerca de R$ 50 milhões, entre eles as reformas e adaptação das Casas
de Cultura, Biblioteca Câmara Cascudo e teatro Alberto Maranhão com a caixa
cênica, peça fundamental para o espaço cênico e que no novo projeto não foi
incluído.
– Reuni uma
equipe de engenheiros e arquitetos que resolveram trabalhar na base da
colaboração e fizeram 45 projetos em três meses, redundando em R$ 50 milhões.
Os que vieram depois de mim engavetaram a maioria dos projetos, principalmente
as Casa de Cultura, que previa as reformas à adaptações, com caixa cênica. O
Teatro Alberto Maranhão também estava com o projeto pronto, mas não encaixaram
a caixa cênica (no projeto) e o Alberto Maranhão sem caixa cênica não é teatro,
mas um mero auditório. Por isso, a previsão para terminar a obra é setembro,
mas preciso resgatar o projeto da caixa cênica, ou seja, a obra vai levar mais
um ano.
Os investimentos financiados pelo Banco Mundial
por meio do programa Governo Cidadão continuam na mira de Crispiniano Neto. Ele
estima que ainda deva ter cerca de R$ 30 milhões em projetos para enquadrar no
cronograma do Banco Mundial.
– Como o
deputado estadual Fernando Mineiro estará no comando do programa acredito que
vamos ter mais sensibilidade para resgatar esses orçamentos, projetos que já
estão aprovados, só falta enquadrar para receber o dinheiro.
Diálogo
Uma das iniciativas que Crispiniano pretende
resgatar é a criação de câmaras setoriais com segmentos da cultura. Questionado
sobre a marca que pretende imprimir na cultura na atual gestão, ele afirmou que
vai trabalhar para reconstruir uma política de cultura para o Estado:
– A marca é
reconstruir uma política de cultura. Não tem o projeto do presidente,
precisamos trabalhar com todas as linguagens artísticas, da área intelectual,
política para cada setor. Vou retomar o trabalho das câmeras setoriais. Vou me
com o Fórum Estadual de Cultura, que é independente da Fundação, para discutir
soluções para cada área. Quando eu saí da FJA a primeira vez, não tocaram as
câmaras setoriais e os artistas criaram o fórum. Na época, criamos associações
de amigos das Casas de Cultura e as casas só não fecharam por causa disso. Não
tem verba, os funcionários não têm carro, não recebem uma diária. As Casas
devem estar com apenas 10% das potencialidades dela.
Extinção do
MinC
Diferente das outras duas passagens, essa chama a
atenção por dois motivos: em nível estadual, será a primeira vez que
Crispiniano terá como chefe uma colega de partido com sensibilidade na área
cultural, a governadora Fátima Bezerra. Por outro lado, também será a primeira
experiência dele sem respaldo em Brasília. Um dos primeiros atos do presidente
Jair Bolsonaro foi extinguir o Ministério da Cultura.
Crispiniano foi gestor da cultura nos governos
Wilma de Faria, Iberê Ferreira de Souza e Robinson Faria, quando o país era
administrado pelos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, respectivamente.
Aliás, ele tomou posse como novo diretor da
Fundação José Augusto em 2 de janeiro, no mesmo dia em que, por decreto, Bolsonaro
acabou com o MinC.
Sobre a coincidência, Crispiniano diz que é um
erro os governos acharem que vão economizar reduzindo o número de ministérios.
Mas avalia que só terá como saber o que o Governo Federal pensa sobre cultura
com o tempo e na reunião dos secretários estaduais, prevista para ocorrer em
março:
– A extinção
do MinC é a grande mentira dos governos brasileiros como medida de austeridade,
de economia. O Bandern, o BDRN foram extintos no Rio Grande do Norte e olha
nossa situação, o que resolveu? Dilma acabou com dez ministérios e foi
derrubada. O Ministério acaba, mas as despesas continuam em algum lugar. O
Sistema Nacional de Cultura é constitucional. Bolsonaro acaba o Ministério, mas
não acaba o sistema nacional. Os programas ficarão prejudicados, mas não serão
extintos. Extinguir ministério é ato simbólico. Mas se ele vai investir na
cultura, e eu acho que não vai, ou em que tipo de cultura ele vai investir, só
vamos saber no fórum dos gestores estaduais de cultura.
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