Por
59 a 21 votos, senadores decidiram julgar a petista,
em
sessão que pode ocorrer a partir do dia 23.
A
presidente afastada Dilma Rousseff irá a julgamento por crimes de
responsabilidade e pode perder definitivamente o mandato. Essa foi a decisão
tomada pelo Plenário do Senado na madrugada desta quarta-feira (10), por 59
votos a 21, na conclusão da fase de pronúncia do processo de impeachment contra
Dilma.
O
julgamento final terá início no fim deste mês, em data ainda não definida
oficialmente.
A
votação concluiu uma sessão iniciada na manhã do dia anterior e que durou cerca
de 17 horas. Ela foi presidida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal
(STF), Ricardo Lewandowski.
Foram
47 discursos de senadores e manifestações dos advogados da acusação, Miguel
Reale Júnior, e da defesa, José Eduardo Cardozo.
Essa
foi a segunda derrota de Dilma Rousseff desde a chegada do processo de
impeachment ao Senado. A primeira, em 12 de maio, resultou na abertura do
processo e no afastamento temporário da presidente. Na ocasião, 55 senadores
votaram pela admissibilidade do impeachment e 22, contra.
A
partir de agora, abre-se um prazo de 48 horas para que a acusação ofereça seu
libelo (narração do fato em julgamento e pedido da pena) e indique até seis
testemunhas para serem ouvidas em Plenário. Logo depois, a defesa terá outras
48 horas para apresentar o seu contraditório, além de também indicar até seis
testemunhas.
Concluída
essa etapa, Lewandowski marcará a data do início do julgamento, notificando as
partes com antecedência de dez dias.
Denúncia
A
presidente afastada Dilma Rousseff é acusada de ter cometido crime de
responsabilidade contra a lei orçamentária e contra a guarda e o legal emprego
de recursos públicos, na forma de três decretos de abertura de créditos
suplementares e operações com bancos públicos consideradas ilegais. Todos os
atos são do ano de 2015.
Segundo
a acusação, os decretos foram editados em desacordo com a meta fiscal vigente e
sem a autorização do Congresso Nacional. A defesa argumenta que eles têm
respaldo da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2015 e que não houve dolo da
presidente, que teria apenas seguido recomendações técnicas e jurídicas de
outros órgãos.
As
operações com os bancos — as chamadas “pedaladas fiscais” — consistiram no
atraso do pagamento de equalizações de juros para os bancos no contexto do
Plano Safra, de fomento à agricultura familiar. A acusação afirma que esse
atraso configura operações de crédito entre os bancos e a União em benefício do
Tesouro, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
A
defesa refuta esse entendimento. Segundo ela, desde a criação do Plano Safra,
em 1992, há atrasos nesses repasses, por questões operacionais, e eles não podem
ser interpretados como operações de crédito. Além disso, a defesa alega que
todos os débitos foram quitados, não restando prejuízo para os bancos, e que
não houve participação direta da presidente Dilma nesse processo.
A
denúncia é assinada pelos juristas Hélio Pereira Bicudo, Miguel Reale Júnior e
Janaína Conceição Paschoal. Ela foi protocolada na Câmara dos Deputados no dia
1º de setembro de 2015, e aceita em 2 de dezembro do mesmo ano pelo
ex-presidente da casa, deputado Eduardo Cunha.
Relator
A
decisão do Plenário confirmou o parecer da Comissão Especial do Impeachment,
aprovado na semana passada. O senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), relator da
comissão, foi o primeiro a usar a palavra. Ele defendeu seu texto, argumentando
que o trabalho da comissão produziu provas suficientes para demonstrar
“cabalmente” a prática dos crimes de responsabilidade que constam da denúncia
contra a presidente Dilma Rousseff.
"Percebe-se
claramente que, tanto no episódio dos decretos quanto no das “pedaladas”, a presidente
pretendeu dar continuidade a práticas manifestadamente ilegais para sustentar
politicamente o início de seu segundo mandato", afirmou o senador.
Anastasia
avaliou que o eventual retorno de Dilma ao exercício da Presidência
representaria “risco” para o equilíbrio das contas públicas. Ele salientou que
o julgamento da presidente afastada pode ser uma garantia de respeito ao Estado
de direito no âmbito da política fiscal.
"O
que se rechaça é a usurpação das prerrogativas do Congresso Nacional, a manipulação
dos bancos públicos e a fraude às contas públicas. Pela gravidade de que se
revestem, essas condutas são, por justo motivo, tipificadas como crimes de
responsabilidade", argumentou Anastasia.
A
Comissão do Impeachment trabalhou por 101 dias entre o fim de abril e o início
de agosto. Nesse período, os senadores membros ouviram 44 testemunhas,
analisaram três laudos periciais e votaram dois relatórios. A presidência coube
ao senador Raimundo Lira (PMDB-PB).
Debate
Depois
da manifestação de Anastasia, os senadores se revezaram na tribuna ao longo das
horas seguintes para falar a favor ou contra a continuidade do processo de
impeachment. Defensores do afastamento elogiaram o relatório, sustentando que
foram produzidas provas suficientes para julgar a presidente Dilma. Por sua
vez, os aliados de Dilma Rousseff trataram o processo como um golpe de Estado e
falaram em ameaças à democracia brasileira.
Apesar
de a sessão ter começado pouco antes das 10h, a etapa de debates só se iniciou
após as 13h, devido a uma série de questões de ordem apresentadas no início dos
trabalhos (ver abaixo). Como cada senador teve direito a dez minutos para expor
o seu ponto de vista, a previsão era que apenas a fase de debate se estendesse
até a madrugada.
Em
função disso, alguns parlamentares abriram mão da palavra para antecipar a
votação. Foi o caso do PSDB: dez dos 11 senadores tucanos retiraram seus nomes
da lista de inscrição e permitiram que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) falasse
em nome de todos.
O
presidente Ricardo Lewandowski interrompeu a sessão por duas vezes, ao 12h e às
18h, para intervalos de uma hora. Entre o fim da tarde e o início da noite,
duas propostas diferentes, dos senadores Aécio Neves e Vanessa Grazziotin
(PCdoB-AM), foram apresentadas para que a sessão fosse encerrada ao fim dos
discursos e retomada apenas na manhã desta quarta-feira. Como não houve
consenso, Lewandowski optou por manter a continuidade dos trabalhos.
Os
defensores da presidente afastada apresentaram requerimentos para destacar do
texto do parecer cada uma das quatro acusações, de modo que elas pudessem ser
discutidas e votadas individualmente.
Após
a votação do relatório de Anastasia, os senadores analisaram os destaques, que
tratavam das “pedaladas fiscais” referentes ao Plano Safra, de um decreto de
suplementação orçamentária no valor de R$ 29 bilhões e de outro decreto de
suplementação no valor de R$ 600 milhões. Antes, os senadores debateram as
questões preliminares apresentadas pela defesa, que foram agrupadas num
destaque.
Ao
final, os senadores rejeitaram todos os destaques e mantiveram os termos do
parecer de Anastasia.
Acusação
e defesa
Ao
fim dos discursos dos senadores, a acusação e a defesa tiveram a palavra por 30
minutos cada para apresentarem suas manifestações finais na fase de pronúncia
do impeachment. O jurista Miguel Reale Júnior, um dos autores da denúncia
contra a presidente Dilma Rousseff, falou em nome da acusação.
Segundo
ele, Dilma não está sendo afastada por “fatos isolados” de cunho fiscal, mas
pela forma “irresponsável” como conduziu o país.
"Esta
Casa foi desrespeitada seguidamente pela presidente da República. Não é ato
isolado. É forma de conduta seguidamente praticada ao longo dos anos.
Desconheceu-se absolutamente qualquer prudência, qualquer cuidado com as
finanças públicas. Desconheceu-se essa Casa como uma Casa de controle",
afirmou Reale.
O
advogado de defesa da presidente afastada, o ex-ministro da Justiça e
ex-advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, questionou a abordagem de
Reale Júnior. Para Cardozo, o advogado da acusação evitou falar dos autos do
processo porque as provas que sustentavam as denúncias foram derrubadas.
"As
provas são fatais, arrasadoras e demonstram a inocência da senhora presidente
da República em relação aos fatos. Crimes de responsabilidade exigem a
demonstração por meio de um processo. Quando um acusador foge desse debate, é
porque algo está frágil no seu raciocínio", disse Cardozo.
Miguel
Reale Júnior declarou que Dilma mostrou-se “indigna” de exercer a Presidência
da República porque governou por meio “da obscuridade e da mentira”. Cardozo
salientou que o processo de impeachment viola a Constituição e o Estado de
direito e é passível de anulação devido a falhas procedimentais do relatório.
Questões
de ordem
Antes
do início da discussão, o presidente Ricardo Lewandowski respondeu a questões
de ordem apresentadas por senadores aliados da presidente afastada. Em uma
delas, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pedia a suspensão do processo de impeachment,
alegando que um fato novo “gravíssimo” surgiu nos últimos dias.
Ele
se referia a denúncias divulgadas na imprensa de que o empresário Marcelo
Odebrecht, em delação premiada, teria acusado o presidente interino Michel
Temer de pedir e receber, em 2014, R$ 10 milhões para o PMDB, seu partido. O
dinheiro seria proveniente de caixa dois.
"A
Operação Lava Jato denuncia empreiteiras que repassaram propinas a partidos em
forma de doações eleitorais. Houve apoio financeiro diretamente negociado por
Temer. Essa negociação ocorreu em dinheiro vivo. Os fatos são
gravíssimos", alegou Randolfe.
O
senador Lindbergh Farias (PT-RJ) alertou que o afastamento definitivo de Dilma
Rousseff representaria uma “blindagem” a Temer, uma vez que, como presidente
efetivo, ele não poderia ser investigado por fatos anteriores ao início do
mandato.
Em
outra questão de ordem, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) alegou a
suspeição de Antonio Anastasia para exercer a relatoria do processo de
impeachment. Segundo ela, o parlamentar não poderia ter assumido tal função por
pertencer a um partido que teve um de seus filiados como signatário da
denúncia.
O
presidente Ricardo Lewandowski rejeitou as questões de ordem. Em relação à
suspensão do processo, ele argumentou que tratava-se de questão estranha ao
objeto da sessão. Sobre a suspeição de Anastasia, Lewandowski afirmou que o
assunto já havia sido decidido anteriormente.
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